A doença pode ter períodos de remissão, especialmente na adolescência, e depois voltar na idade adulta. Para dar atenção a ela, 23 de setembro foi instituído como o Dia Nacional de Conscientização da Dermatite Atópica pela Sociedade Brasileira de Dermatologia e pela Associação Brasileira de Alergia e Imunologia. Reunimos tudo que você precisa saber sobre a doença, e a melhor maneira de lidar com ela para que o seu filho tenha mais qualidade de vida.
O que é dermatite atópica?
É uma alteração inflamatória crônica da pele, imunomediada (que se manifesta quando o sistema de defesa do organismo não reconhece um possível agressor e, por isso, ataca células saudáveis do próprio corpo) que não tem cura. Não é contagiosa e, segundo Clarissa Prati, assessora do Departamento de Dermatologia Pediátrica da Sociedade Brasileira de Dermatologia, ocorre devido a uma tendência genética familiar. “Se os pais (ou um deles) têm alguma manifestação de atopia, inclinação hereditária de desenvolver manifestações alérgicas, como asma, rinite ou alergia alimentar, são grandes chances de o filho desenvolver também, e aí, pode manifestar a dermatite atópica”, afirma.
O principal é o prurido (coceira) que pode ser de grande intensidade, prejudicando o sono e as atividades habituais. A pele seca característica e a coceira desencadeiam uma reação inflamatória deixando o local vermelho e com lesões. Nos casos mais graves, a pele fica bastante ferida.
Que áreas atinge com maior frequência?
A dermatite atópica atinge áreas diferentes da pele, dependendo da idade da criança. Nos bebês pequenos, geralmente afeta bochechas, tronco e regiões extensas de membros superiores e inferiores. “Após os 2 anos, é comum que as lesões se localizem nas dobras atrás dos joelhos e dos cotovelos, além do pescoço, punhos e tornozelos”, diz a dermatologista pediátrica Juliana Loyola Presa, professora da Universidade Federal do Paraná e das Faculdades Pequeno Príncipe.
Existem gatilhos que podem provocar o problema?
Cada paciente deve ser avaliado de maneira individualizada, pois as causas podem ser diferentes de um para outro. Alguns pioram no inverno devido ao clima frio e seco enquanto para outros o pólen da primavera é o grande gatilho. Há crianças que sofrem com o calor, pois o suor age como um irritante para a pele. De forma geral, toleram pouco os produtos de higiene perfumados e coloridos. Mais recentemente, também têm se observado muitos casos de dermatite atópica relacionados a alergias alimentares.
“Cecília tem dermatite desde bebê, mas aos 2 anos, piorou. Ela começou a ir para a escola,e o estresse e a ansiedade aumentaram. Com isso, a situação se agravou. Tratava com pomada de corticoide, mas, só um ano depois, aprendi que não posso dar banhos quentes, demorados, nem esfregar a pele com esponja. Nas crises, coça tanto as pernas que, quando menos percebo, ela está sem roupa.”
Thaís Florêncio, 36 anos, bancária, mãe de Cecília, 4 anos
Que cuidados os pais devem ter nesse sentido?
Manter a hidratação da pele da criança, sobretudo após o banho, passar longe dos alérgenos mais comuns, como sabão em pó e amaciante, evitar que roupas de lã ou de materiais sintéticos (mesmo a etiqueta) entrem em contato direto com a pele, dando preferência a tecidos naturais. Se o problema for relacionado a alergia alimentar, é imprescindível ficar atento ao que o pequeno ingere, e isso pode variar de acordo com cada um.
Qual é o tratamento?
A base do tratamento é a hidratação da pele. “Quando as lesões estão inflamadas, o alergista ou dermatologista poderá indicar alguns cremes que controlam a inflamação. Se houver sinais de que elas estejam infectadas, um antibiótico deverá ser prescrito”, afirma Márcia Carvalho Mallozi, coordenadora do Departamento Científico de Dermatite Atópica/Contato da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (Asbai).
Um artigo publicado recentemente na Biblioteca Nacional de Medicina dos Estados Unidos, a maior biblioteca médica do mundo, traz esperanças sobre novos tratamentos que vêm sendo testados, especialmente com estudos avançados sobre o microbioma cutâneo (conjunto de micro-organismos que habita a pele – no caso da dermatite atópica, há um desequilíbrio em relação às bactérias do bem): um medicamento de uso tópico chamado crisaborol, e outro administrado via subcutânea em pacientes maiores de 12 anos, de nome dipilumabe, são algumas das grandes promessas. Vale reforçar que essas alternativas ainda estão no campo dos estudos e, além disso, nenhum medicamento deve ser usado sem prescrição médica.
A dermatite atópica tem herança genética associada à influência do ambiente, portanto, é difícil falar em evitar a doença. O que se sabe por meio de pesquisas ao longo do tempo é que filhos de pais que apresentam alergias ou os que tiveram na infância seriam beneficiados com aleitamento materno, alimentação o mais saudável possível e uso de hidratantes na pele desde recém-nascidos.
A dermatite atópica pode ser associada a doenças, como asma e outras alergias?
Segundo a dermatologista pediátrica Juliana Loyola Presa, sim. “Gosto de explicar aos pais que a dermatite atópica anda de mãos dadas com a asma, rinite e, mais recentemente, com a alergia alimentar. É importante esclarecer que uma doença não se transforma em outra, mas elas compartilham mecanismos imunológicos semelhantes e podem ser observadas em diferentes momentos da vida de um paciente”, diz.
“Fiquei internada com a Ana por três vezes. Íamos para o hospital e diziam que era virose, fiz tanto exame de sangue nela à toa… Foram uns seis meses assim, até que uma médica suspeitou de dermatite. Depois que passei a usar sabonete e os cremes certos, nunca mais! Se a gente não fica atenta ou não pesquisa, acha que tudo é normal, mas nem sempre é.”
Danielly Souza, 33 anos, supervisora de vendas, mãe dos gêmeos Ana e João, de 1 ano e 10 meses
Dermatite em criança e dermatite em adulto: é diferente?
De forma geral, a coceira e a pele seca são semelhantes, mas a localização das lesões será distinta. No adulto, por vezes, se observa uma pele mais grossa e áspera nas dobras de membros superiores e inferiores. Vale ressaltar que as crianças que apresentam formas mais graves e de difícil controle, além de um maior impacto por alterações emocionais, têm mais risco de persistirem com a doença ativa durante a vida adulta.
Dermatite tem a ver com o emocional?
Esse lado pesa bastante. Não que a dermatite atópica seja causada por fatores emocionais puramente, mas o estresse é um dos importantes gatilhos da doença. Em uma criança irritada, cansada e ansiosa, o controle possivelmente será mais difícil. Buscar ajuda psicológica pode ser um dos grandes pilares no tratamento. No Brasil, hoje existem grupos de apoio a pacientes e suas famílias – saber que outras crianças passam pelas mesmas dificuldades e dividir experiências pode ser um aliado no controle dos sintomas.
Como melhorar a qualidade de vida dessas crianças?
Com a orientação adequada de seus cuidadores e, também, com a conscientização dos cuidados pela própria criança, quando ela já entender. Banhos mornos e rápidos, seguidos de hidratação da pele, afastamento das causas de piora da dermatite atópica (quando forem conhecidas), sempre com a orientação para medicamentos que devem ser usados, assim que a criança apresentar lesões. “Como a coceira é um sintoma bastante comum e interfere muito na qualidade de vida dos pacientes, controlá-la é essencial. Para isso, vale utilizar hidratantes, que são a base do tratamento, anti-inflamatórios e medicação sistêmica (administrada na circulação sanguínea)”, afirma Clarissa Prati, da Sociedade Brasileira de Dermatologia.
A criança com dermatite pode levar vida normal?
A rotina da criança com dermatite atópica deve ser a mais normal possível, sempre respeitando algumas restrições. Praia e piscina, por exemplo, não são proibidas, mas devem se tomar os cuidados inerentes à exposição ao sol e à água do mar ou piscina, com o uso de proteção solar. Ao voltar para casa, a criança deve tomar banho com água doce não clorada, usar o sabonete com o qual está acostumada e fazer a hidratação em seguida.
O principal é orientar colegas da turma, professores e coordenadores de que a dermatite atópica não é contagiosa. Quando há lesões aparentes nas mãos, pernas, rosto ou pescoço, a criança pode sofrer não só pela doença em si, que provoca coceira extrema, mas também por bullying, quando os outros pequenos a afastam das brincadeiras. Mais um cuidado: ter sempre um hidratante na mochila. Pode acontecer de a criança apresentar um início de crise – pele vermelha ou rachadura – e a orientação é hidratar imediatamente.
O que fazer quando a criança não se controla e coça até ferir a pele?
Quanto mais se coça, mais sente vontade de coçar. Romper este ciclo é fundamental, e a hidratação é a principal aliada nesse processo. Hidrate a pele, deixando-a melecada, mesmo. Procure manter as unhas do seu filho sempre curtas e tente distraí-lo, cantar uma música, brincar e acolher. Há opções que ajudam o pequeno nas crises mais fortes: as mais indicadas são cremes e pomadas, mas os pais precisam ficar atentos ao tipo de tratamento que farão. “Os produtos dermatológicos à base de pimecrolimo são uma opção segura e adequada, pois essa é a única molécula que pode ser indicada a partir dos 3 meses, e que atua reduzindo as crises de dermatite. Outros medicamentos têm nível de toxidade elevada, como é o caso dos corticoides, portanto é preciso sempre seguir à risca a orientação médica”, diz o pediatra e nutrólogo Fábio Ancona, professor aposentado da Unifesp.
*Revista Crescer
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